sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

O Sangue do Adeus

Agora, caiem as últimas gotas de água
Que escorrem dos telhados
Enquanto os primeiros raios de sol
Tentam romper a péle.

O silêncio equilibra
A ausência de palavras
E por instantes
O tempo transforma-se
Numa elegante mentira
Que nos mostra o brilho ao longe
Escondido num brusco adeus.

sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

O Fim

O coração reconhece
A mente explora
Os olhos escondem
Os sentidos adormecem
Acreditando numa flácida certeza
Afogada no efeito placebo.

É irreal
Anormal
Banal.

Existe uma enorme
Tensão nervosa
Que explora
Cada cavidade
Do estado esbatido
Que não quer reencarnar
Nem pensar, lutar ou apenas ficar
Para vencer toda aquela fraca expressão
Que nos assalta os poemas
Escritos na água, em vão.

Tem medo
É inseguro
É desconhecido.

Poderiam existir
Grandes mensagens plantadas
Em cada opção de partida?
Poderiam existir mágoas esquecidas
Durante o longo percurso
Que se suicidam na meta final?
Não.
É apenas o fim:
Seco
A meia luz
Decadente
Frágil e doente
Sem ventre, o fim.

O início

Aproxima-se o entusiasmo
E sonha-se que tudo cheire a novo.
Desejamos verificar
Que tudo foi renovado
Como se fosse assim
O caminho traçado
Pela austeridade
Da palavra humana.

Renasce a esperança
Engana-se a razão
Acredita-se na mudança
E recomeça a toda a aventura
Descendo espinhosas montanhas
De coração na mão
Com a vida
No limite de uma falésia
Porque o início
Só se vive uma vez.

domingo, 26 de dezembro de 2010

Narciso Bravo

Quando te olhava nos olhos
Reparava na profundidade
Do teu miserável olhar.
A tua infância tinha sido
Amargamente sequestrada
Por um cego nevoeiro
Que ainda hoje
Regressa, disfarçado
Numa onda nostálgica de Inverno.

Entre recantos
De bravia natureza
Fundida aos poucos
Para uma sólida e desconfortável
Caixa cinzenta, era visível
O sentimento claustrofóbico
Que te burlava a mais intima dor
Que escondes no fundo
De um velho baú.

Caíram enumeras vezes
As preciosas pérolas
Dos teus olhos
Que corroeram toda a nitidez
Dos retratos gastos
Pelos estado atmosférico
Do passado, remendado como
Uma desprezada boneca de trapos.

Num brusco movimento
A vida consciente
Voltou a destruir
Todo aquele espaço branco
Cravado no teu interior
Como uma nota tóxica
Despejada no teu corpo
Que te obstruía todas
As possíveis saídas
Do labirinto onde dormias
Como uma pétala seca
De um Narciso.











sábado, 25 de dezembro de 2010

Noite Fria

O tempo passa
E hipnotiza-te
No meio da multidão.
Engoles o pó
Das pessoas que correm
Sem pisar o chão
Onde dormes todas as noites.

Poderiam ser espinhos
Ou talvez punhais
Mas não.
É apenas tristeza
Pura e dura, como o aço.

Quando percebes
Que te tens de levantar
És empurrado
Por correntes de ar
Vindas da falsa nostalgia
Que esvoaça
Atrás da tua casa.

No fim
Esperas que alguém
Te tire a venda dos olhos
E te beije cada cicatriz
Que o tempo te ofereceu.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Jardim de Inverno

Idolatrava,
Um dia conseguir
Apreciar todos os reflexos
Destas diversas luzes
Que giram à minha volta.

Existe algo
Que me interrompe
O admirar desta sala.

Existe algo dentro de mim
Que não identifico.
É invisível
Intocável
Intolerante
Cansa-me
Provoca-me tédio
Não me deixa viver
É uma leveza absurda
É um nó.


quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Violleta

Violleta
Ainda me lembro da primeira vez
De que me falaste da morte.
Exclamaste que a morte era um segredo
Sobre um segredo.
Quanto mais sobre ela sabemos
Mais mentimos sobre a sua essência.

Violleta
A minha infância morreu nesse dia.
Ainda te lembras quando foi?
Era Inverno e eu estava com frio, Violleta.
Tu, estavas pálida e com a saia do costume.

Todos sabemos
Que não passa de um vistoso ponto final
Que sucede a uma afiada vírgula mal engolida.
Faz ferida mas não dói.
Já doeu, Violleta.

Vale tudo
Neste grandioso formol
De luzes fundidas e reticentes.
É um corredor de espelhos partidos
Que reflectem todas as pequenas partes
Que nos constituem.

São noites tempestuosas
Onde chovem cavilhas ferrugentas
Que nos ferem o corpo
Num breve suspiro
Que nos marca para sempre.

Aos poucos
Ensinaste-me a dormir sem ter medo
Cantavas canções de embalar
Até que caísse num mundo irreal
Sem fendas nem tremores.

Eram longas as noites
Em que pairávamos sobre estacas ensanguentadas.
Sentíamos o verdadeiro cheiro do sangue.
Cheirava a pétalas de orquídea
A pó e a cofre aberto.
Costumávamos reparar no som
Assemelhava-se ao de um vinil riscado.

Agora, Violleta
Agora que estamos mortos
Frios e longínquos
Que sabemos sobre a morte, Violleta?